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05/03/2017 | MULHER, MÃE, SERVIDORA E OFICIALA
Sento em frente ao monitor, são 23:30h e os meus neurônios se debatem enquanto meus hormônios estão à flor da pele... Os filhos já estão dormindo, também pudera o dia deles foi igual a uma gincana!!!
Paro, reflito, pondero e questiono: afinal, o que é ser mulher? Mais que uma questão de genética e de gênero eu me faço a pergunta na perspectiva mais profunda do meu âmago, pois quem sabe assim eu obtenha a resposta!?
O dia foi longo, foram muitas frentes de trabalho e muitas demandas. Enquanto por segundos estudei no espelho qual o melhor tom da sombra, do blush e do batom lembrei que tenho hora marcada para uma intimação assim que deixar os filhos na escola.
E meu itinerário me invade enquanto entre um sinaleiro e uma fechada no trânsito novamente me questiono: afinal, o que é ser mulher? Não genericamente, mas especificamente? Na primeira pessoa mesmo...
Confesso que já revirei a literatura, faz tempo que me ocupo buscando a definição pessoal, a fim de me organizar melhor diante de tantos apelos midiáticos, tantas propostas publicitárias e tantos papéis que o mundo me sugere.
Comecei lendo \"Mulheres inteligentes, escolhas insensatas\", não por me julgar muito inteligente, nem por supor que fiz escolhas tão insensatas...apesar de algumas cabeçadas... mas seria bom entender o universo feminino a partir de uma análise masculina, pensei.
Depois me debrucei sobre outra literatura, \"Mulheres que amam demais\", um alerta importante na regulagem da nossa intensidade emocional que pode afetar a saúde dos nossos relacionamentos. Mas quis ir adiante, no afã de decifrar o ponto em que nós mulheres nos encontramos, nas nossas questões comuns e nas particulares, li \"Mulheres que fazem demais\", uma sequencia que considerei óbvia pois nós mulheres não sabemos amar sem ativismo! Foi quando descobri que temos a dimensão física, emocional e espiritual... mais isso para pensar e colocar na minha lista!!!
Eu poderia ter me dado por satisfeita, mas lembre-se...eu sou uma mulher e essa palavra \"satisfeita\" possivelmente está fora do meu dicionário. A minha busca incessante virou uma quase obsessão, então logo após ter casado fui aconselhada a ler \"Homem Cobra - Mulher Polvo\" e deparei-me com aquela sensação esquisita de que essa vida multitarefa é algo atávico do qual não terei como me livrar tão cedo. E vou debatendo meus tentáculos caminho afora, um deles na cozinha, o outro nas prateleiras do mercado, o outro afagando o marido e filhos, o outro entregando e certificando mandados...
Para arrematar as diferenças de gênero também li \"Homens são de Marte, mulheres são de Vênus\" e decididamente as influências interplanetárias poderiam ter sido menos radicais quando o assunto é a nossa comunicação...isso teria facilitado uma porção de coisas, sabia?
Poxa, essas literaturas quase me deram um nó, esse emaranhado informativo me graduou em ansiedade. Mas lá estava eu novamente em uma livraria, como um radar, procurando de uma vez por todas algo que me aquietasse com uma definição clara e concisa de qual o limite dos papéis a desempenhar e como fazê-lo com uma boa dose de sustentabilidade. Fui atraída por um título que me pareceu ótimo: \"Todo poder às mulheres\". Como eu não tinha pensado nisso antes? Alguém enfim definiria os atributos e as atribuições e essa palavra \"todo\" tinha tudo a ver dada a abrangência do advérbio. Foi-se a definição clara e concisa, mas fiquei atraída pelo poder, preciso confessar.
Foi quando percebi que no estágio evolutivo da busca pela resposta fui ganhando liberdade em ser a mulher que eu queria ser, não por imposição social, mas por necessidade pessoal. Não por disputa de gênero no desejo de ser melhor que o homem, coisa que a gente não é. Não por ter obrigações que a mídia criou ou mesmo que as ativistas que deliberadamente queimaram seus sutiãs na praça avocaram para si (e eu sempre deixo claro que não concordo, não fui consultada e que não estava lá). Algo diferente começou a nascer, de dentro prá fora sabe? Possivelmente em razão de eu ter passado dos 30... fui percebendo que o todo quem define sou eu, essa trajetória é exclusiva e me pertence. E se algum poder há é exatamente esse: saber o limite das minhas atribuições dentro de meus atributos.
Atualmente muito se fala em emponderamento feminino, a ONU (Organização das Nações Unidas) estabeleceu sete princípios relacionados ao assunto[1] todos baseados na equidade de gêneros e fiquei novamente intrigada, inquieta e ansiosa. Tenho receio de retrocessos, nós já lutamos tanto por \"igualdade\", já fizemos tantos \"progressos\" que nos sobrecarregaram os ombros e nos deixaram exaustas... Desculpem-me, não quero ser retrógrada, não quero ser machista, mas a igualdade de gêneros é uma falácia, uma ficção abusiva, uma atrocidade sistêmica, uma inversão desonrosa que traz proveito ao mercado, ao capital.
Enquanto persisto em minha jornada, já com o batom desbotando, a maquiagem vencendo, indo buscar filhos na escola e pensando no que fazer para o jantar eu me debato comigo mesma e me questiono: porque nessa trajetória corrida não protestei contra a ficção da igualdade? Porque me senti em vantagem em ser igual sem de fato ser igual? Eu deveria ter acordado antes e rasgar meu verbo em defesa das minhas diferenças, porque como bem diz o jurista justo é tratar com igualdade os iguais e desigualdade os desiguais, na medida em que se desigualam.
Agora estou eu, aqui, como tantas oficialas e colegas servidoras, cogitando contribuir para não me aposentar, cogitando me aposentar quando a firmeza dos meus passos já não estiver tão firme e para um dia receber aquém do que contratei possivelmente no período em que eu mais necessitar.
Que emponderamento feminino é esse? Ser ele tem moldes de um poder que não foi conquistado com base em nossas características e nossos valores ele só tem de feminino o título. E terminologias não constroem realidades, muito pelo contrário...
Hoje é o dia internacional da mulher e eu convido cada servidora, cada colega oficiala à uma reflexão profunda: afinal, o que é ser mulher? Convido cada uma a se colocar diante do espelho e questionar a si mesma sobre a real necessidade de instaurarmos um modelo de poder feminino na essência, a começar pelos nossos lares, baseado em valores como cooperação, solidariedade, generosidade, respeito às diferenças e a expandir fronteiras até os nossos postos de trabalho. Já deveríamos ter começado antes, mas ainda está em tempo!
Fabiana Rodrigues Silveira da Cruz
Oficiala da JFPR
[1] Disponível em: http://www.onumulheres.org.br/referencias/principios-de-empoderamento-das-mulheres/